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19 outubro 2006

AXO - PORTUGAL * RAÇA * IMPÉRIO

Notas pessoais a propósito do surgimento dos "Heróis do Mar" e das suas conotações fascistas. Notas para a história do AXO:

Estávamos em Março de 1981, eramos todos muito jovens e naturalmente muito idealistas, a Faculdade de Letras de Lisboa dava guarida às nossas conspirações, embora alguns de nós já se conhecessem de outras caminhadas, anteriores, intensas e diversas que haviam forjado sólidos laços de confiança senão mesmo de amizade.

Os três grandes impulsionadores do pujante e efémero movimento que se veio a conhecer como AXO (sempre entendido como um grito de ordem, facilmente utilizável e que jamais pretendeu ser a sigla do que quer que fosse..), foram o Paulo Borges (que cursava filosofia), o Pedro Ayres Magalhães (que cursava psicologia) e o António Albuquerque Emiliano (cujo curso me não recordo...). Conhecia apenas o Paulo e o Pedro quando, em Abril desse ano, me procuraram na cave da Faculdade, onde funcionava o Aparelho Técnico no qual trabalhava, como tipógrafo, para fazer face aos custos da vida de estudante. Paradoxal veio a revelar-se a utilização do Aparelho Técnico da AEFLL, então controlada por uma lista próxima da UEC (União dos Estudantes Comunistas), para a elaboração, frequentemente a altas horas da noite, dos nossos, comunicados, manifestos e material de propaganda.

Confesso que a primeira abordagem, por parte do Pedro e do Paulo, me deixou desprevenido, conheciamo-nos de bem diversas situações e a arrojada linguagem e propósitos do AXO, despertava-me para um universo bem diferente. Cedo, porém, as ideias e discursos dos meus amigos, tal como a eles, vieram preencher um ansiado vazio de anos de intensa e conturbada vida musical.

Não foi por acaso que se escolheu o dia 25 de Abril, pululavam então os cravos vermelhos na FLL, para a emissão do primeiro comunicado dos auto-proclamados “Arautos do Quinto Império”, o tema não poderia parecer mais desjustado às abrilinas festividades:

O Mito Renasce – A raça está Viva!”, o conteúdo da declaração continha três pontos e alguns incitamentos:

“1. O sistema democratico-populista e o preconceito do valor das multidões esgotam as possibilidades de aproveitamento total das capacidades superiores da Raça Humana.

A luta Axista devastará o reino das trevas!

2. O predomínio ditatorial dos valores decadentes e niveladores duma moral de rebanhos arrasta o indivíduo para o infindável abismo da doença.

3. A asfixia dos impulsos apaixonados, a calúnia do vigor e da energia, o culto do meio-termo e da inércia, a falta de ousadia, são as infames amarras que estrangulam as formas mais elevadas da Criação.

A nossa juventude não pode tolerar semelhante podridão e atrofia cultural.

- O SANGUE JOVEM É CHAMADO ÀS LINHAS DA FRENTE.

- Os nossos avós conciliaram, os nossos pais demitiram-se, - NÓS ACTUAMOS.

- É urgente responder ao desafio: chamam-nos novas conquistas.

- RAÇA É O NOSSO NOME!

AXO A NOSSA BANDEIRA!

A GUERRA ESTÁ DECLARADA!

25 de Abril do ANO I

da ERA AXISTA

Dificilmente qualquer outra linguagem poderia parecer mais estranha nesses anos em que a esquerda ainda dominava e em particular na nossa Faculdade.

A 10 de Junho, o incontornável Dia da Raça, como continuávamos a gostar de lhe chamar, proporcionava a ocasião para mais um manifesto:

“CARNE E SANGUE, FERRO E AÇO PELO QUINTO IMPÉRIO!

I - É chegada a altura de provar por actos quem são os melhores filhos da RAÇA. Prová-lo-ão aqueles que tiverem a força de reerguer um único SENTIDO NACIONAL, um sentido que aponte a todos os Portugueses um mesmo FIM ACTIVO para a vida ou para a morte, para a guerra ou para a paz.

II – Este sentido sempre existiu e existirá. Não é outro senão o do Quinto Império, anunciado e prometido por poetas e profetas, prenunciado no apogeu do nosso predomínio mundial, hoje miserávelmente esquecido. – “Provar a esperança de um novo Império, ao qual chamaremos o Quinto” – Padre António Vieira.

III – Apontar ao QUINTO IMPÉRIO significa retornar aos valores supremos que permitiram constituir e manter Portugal como Nação altiva; os valores de EXPANSÃO E CONQUISTA que sempre nos permitiram aspirar a uma missão condutora e dirigente do Mundo.

IV – Nós afrmamos que Portugal só sairá do actual abismo de anemia e decadência, expurgando do poder os fracos, os imbecis e os impotentes, aniquilando a actual ditadura parlamentar e plebiscitária do regime democrático-igualitário. A Nação necessita duma élite dirigente obtida a partir da SELECÇÃO, DIFERENCIAÇÃO E HIERARQUIZAÇÃO das suas forças materiais e espirituais. Só a acção desta casta governante, mercê dum Estado forte não burocrático, poderá instituir uma ordem que nos restitua a honra, o rogulho, a força, a ascendência.

V – O lugar dum PORTUGAL irmanado pela Fé nos destinos do V IMPÉRIO, NÃO é o de parente pobre e mendigo dos dejectos do decadente capitalismo Europeu. Portugal deve encarnar a sua Missão Universalista, inoculando a sua ALMA e o seu SÉMEN no Mundo. Recusando o saudosismo estéril, marchemos rumo ao futuro com as armas e as energias da Glória Ancestral.

VI – O movimento Axista apela ao levantamento de todos os Portugueses, numa corrente anti-parlamentar e anti-partidária. Só uma Nação débil confia ao voto popular a escolha dos seus dirigentes. O actual regime democrático-igualitário, negando o direito à diferença, dá-nos o exemplo mais flagrante da dissolução e gangrena a que conduz o poder irresponsável e medíocre das multidões não submetidas nem dirigidas.

- AXO é o nosso grito: - CONTRA A LAMA DEMOCRÁTICA, A INÉRCIA PARLAMENTAR E O VIL IGUALITARISMO-SELECCIONAR NA LUTA A NOVA CASTA DIRIGENTE! – CONTRA A SUBMISSÃO À DECADÊNCIA EUROPEIA-INDEPENDÊNCIA, EXPANSÃO E RECONQUISTA! – GUERRA NACIONAL PELA NOVA RESTAURAÇÃO! – LANÇAS EM RISTE, ESPADAS AO SOL – PEITOS EXPOSTOS PELO QUINTO IMPÉRIO!

A RAÇA ESTÁ VIVA!”

Em Setembro desse ano surgia, com manifesta publicidade na imprensa (Correio da Manhã, O Dia, O Diabo, A Tarde), o projecto alimentado de recuperação de Olivença.

Das paredes da FLL, principal veículo de divulgação do movimento, registámos os seguintes escritos, tantos deles entrecruzados com a vida da banda “Heróis do Mar” de que o Pedro era, indubitavelmente, o mentor e cabeça. A maior parte deles destinavam-se a chocar o esquerdismo reinante e a provocar a reacção:

- AXO

- Almas Ardentes!

- Almas novas! Sangue novo! Pátria nova! Corpos vigorosos ao poder!

- Amantes furiosos, paixões violentes!

- Arautos do Vº Império

- Cristo era judeu!

Marx era juedu!

Freud era judeu!

Quando nos libertaremos desta maldita herança?

- Cruel destino, morte honrosa!

- Ergamos espadas! Olivença é Portugal!

- Ergamos o Império do sol, do sangue e do aço!

- Igualitários, mordereis o pó.

- Lâminas imperiais para barbas democráticas!

- Mais vale um ano de guerra que cem anos de paz!

- O mito renasce – a raça está viva!

- Olivença é Portugal! Pela Reconquista!

- Peitos exposto pelo Vº Império.

- Pela higiene nacional: freaks e hyppies para a fogueira!

- Purificação Nacional!

- Uma boa guerra santifica qualquer causa!

- Uma razão para viver! Uma razão para morrer!

- Viva o Axismo redentor!

Frequentemente o nosso AXO, era antecedido por um F, FAXO (deveria ler-se FACHO...), ao que acrescentávamos: Fascismo é demasiado populista; cesarismo e castas sagradas! As mentes de esquerda sempre tiveram esta aborrecida tendência para confundir faxo com fascio, enfim.

Para além dos citados e do autor destas linhas, militaram na causa Axista – a que o Miguel Castelo-Branco chamou um dia de "extrema direita sebástica vieiriana", embora jamais houvéssemos discreteado sobre heresiarcas bizantinos, nomes como António José Maia, Edgar Pêra, José Alexandre Conefrey, Pedro Bidarra e Vasco Soares, mantendo o grupo sede na Rua Ernesto da Silva, 30, em Benfica.
No 1º de Dezembro de 1981, conjuntamente com o Grupo dos Amigos de Olivença o AXO desceria até à estátua dos Restauradores, desfraldaria a sua bandeira e o António Emiliano proferiria um inflamado discurso.

O Paulo haveria de continuar a sua cruzada sebástica até pelo menos 1983, mas o grupo, enquanto tal, com a mesma pujança que caracterizara o seu aparecimento já desaparecera.

2 comentários:

  1. Como o nosso Amigo Vitor Ramalho poderá confirmar, tanto que há para contar sobre esses anos, mas em Coimbra!
    Diferente, sem dúvida, mas não menos delicioso.
    Memórias...

    Cumprimentos.

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  2. Caro Humberto Nuno, o António Emiliano estava no meu curso, Letras, embora em clássicas, frequentando eu Línguas e Literaturas Modernas. Bons tempos!

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