13 setembro 2006

DE REGRESSO: OS PERIGOS DA "MEMÓRIA"

Vem promovendo considerável campanha no nosso país um denominado “Movimento Cívico – Não Apaguem a Memória” cujo objectivo é reivindicar do Estado o, no seu entender, dever de preservar os locais simbólicos de luta contra o fascismo. Entre os emblemáticos locais elegeram-se a sede da Polícia Internacional e de Defesa do Estado, na Rua António Maria Cardoso, sua delegação no Porto (actual Museu Militar na Rua do Heroísmo) e Coimbra, as principais prisões políticas (Forte de Peniche, Aljube, Caxias, presídio militar da Trafaria, companhia disciplinar de Penamacor e a fortaleza de S. João Baptista de Angra do Heroísmo), alguns tribunais (sala do ex-Tribunal Plenário da Boa Hora e Tribunal Militar da Graça) e o emblemático campo do Tarrafal (em Cabo Verde).
Tal movimento pretende que, assim, se homenageie a memória da resistência à ditadura e a luta pela liberdade democrática, assegurando-se a memória do sofrimento de muitos portugueses, condenando-se a a brutalidade fascista da PIDE e construindo-se um grande roteiro da repressão salazarista, um verdadeiro “roteiro essencial do fascismo português”.
Como historiador nada tenho, naturalmente, contra a preservação da memória do passado, tão frequentemente maltratada entre nós. Raros são os países, de tão rica história como a nossa, em que por vezes se revela quase impossível resgatar vestígios materiais (ou outros) que pertençam a certos períodos. É mais uma fatalidade portuguesa, para a qual, diga-se em boa verdade, bastante contribuíram, também, alguns dos nossos parceiros dessa UE em que nos meteram. De facto nem só o Egipto foi espoliado, mas a nossa ausência de tradição em preservação é igualmente grande…
Nada tenho, pois, que se registe a memória do regime autoritário que vigorou em Portugal por mais de 40 anos nem daqueles por ele perseguidos. Mas quando se agitam os publicitários espantalhos de um fascismo que, como toda a gente esclarecida sabe, nunca existiu no nosso país, o caso muda de figura. Vai-se, pois erguer a memória sobre um facto que carece de rigor, como licitamente se poderá pensar de modo análogo será preservada tal memória. Memória eivada de preconceitos, privada de fontes que desapareceram por força de interesses particulares ou colectivos (tantas delas na posse dos visados) e desde logo caracterizada por um claro posicionamento ideológico onde tantas mistificações devem ser continuadas, abusos propagandeados, funcionários demonizados e”mártires” (como aquele líder de um Partido Comunista que na prisão “fascista” concluiu a sua licenciatura em direito… o que faria se o fascismo fosse o que eles dizem…) glorificados. Enfim, um modelo do qual sabemos o que esperar sobre a “Gestapo portuguesa”.
Mas uma pergunta emerge: e para esse período não seriam igualmente de preservar as memórias da Mocidade Portuguesa, da Legião Portuguesa, de Salazar, etc…, constituindo-se os respectivos museus?
É que a História e a história são coisas diversas e para uma visão global todas importam, ou só certas memórias interessam?

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1 Comments:

Blogger Mário Casa Nova Martins said...

Um regresso perfeito!

Cumprimentos.

quinta-feira, 14 setembro, 2006  

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