11 abril 2008

COISAS DESTE NOSSO PAÍS...

Não é surpresa para ninguém que o nosso país é pródigo em coisas surpreendentes, mas, por muito atávica que tal tendência seja, jamais me deixo de surpreender com certas coisas que se passam cá pelo burgo.

Chegou a vez da vetusta fragata "D.Fernando II e Glória", que como sabem foi o último grande navio à vela da Marinha Portuguesa e a última "Nau" a fazer a chamada "Carreira da Índia" (notável e importante linha militar regular que, desde o século XVI e durante os 3 séculos seguintes, fez a ligação entre Portugal e aquela antiga dependência). Foi ainda esta fragata o último grande navio que os estaleiros do antigo Arsenal Real de Marinha de Damão construíram para a nossa Marinha, realizando a sua primeira viagem em 1845.

Todos se recordam que, até há bem poucos anos jazia encalhada no Tejo, vítima de um incêndio que a destruiu quase na totalidade em 1963. Durante cerca de três décadas teimosamente permaneceu, adornada sobre bombordo e "teimando em mostrar que o desgaste natural do tempo se devia sobrepor ao esquecimento dos homens". Uma velha glória da Marinha e uma embarcação emblemática teimava em jazer no rio sem que se vislumbrasse destino para tais destroços. Um crime, uma pena patrimonial como tantas outras que, de lés a lés, vai persistindo em mostrar uma faceta menos "porreira" deste hoje socrático país...
Em 1990, em boa hora, foi assinado um Protocolo entre a Marinha e a Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, tendo por objectivo a recuperação da fragata "D.Fernando", projecto naturalmente confiado à Marinha, dele sendo encarregado o Arsenal do Alfeite. O Estado e muitas empresas abraçaram o projecto e em Janeiro de 1992 o casco do navio (tudo o que então restava) era removido do local onde se encontrava e transportado, em Setembro de 1992, numa doca flutuante para o estaleiro da "Ria-Marine", em Aveiro, para efectuar o restauro estrutural. Em 8 de Abril de 1997 (há onze anos portanto)concluídos os trabalhos a "D. Fernando" era lançada à água. Rebocada para Lisboa, para o Arsenal do Alfeite onde foi feito o aprestamento e o apetrechamento museológico, última fase do projecto de recuperação da fragata, foi aumentada ao efectivo dos navios da Armada em 28 de Abril de 1998. Como todos se recordaram após entrega ao Museu de Marinha esteve em cais próprio, na Expo'98.
Acontece que onze anos depois, leram bem onze anos apenas, após um restauro que demorou oito anos e não obstante custos de recuperação que se elevaram aos 11 milhões de euros a fragata "D. Fernando" procura investidores (conforme notícia recente em diversos jornais). Perguntarão porquê?
A resposta é simples mas infelizmente verdadeira. O trabalho foi mal feito e apenas onze anos depois, uma embarcação que navegou o equivalente a quase cinco voltas ao mundo, está a precisar de uma recuperação profunda no casco, de substituição das grandes tábuas, de calafetagem...
Inacreditável. O espantoso é que ninguém se tenha lembrado de apurar as responsabilidades em toda esta questão da "Ria-Marine", em Aveiro, que em 1997 foi responsável pelo restauro (e que restauro...) estrutural daquela fragata. E como Expo's não as há todos os anos creio, e temo, que lá continuará na doca seca de Cacilhas impossibilitada de contacto com a água.

Etiquetas: